"A maioria dos homens emprega a metade da vida preparando a infelicidade da outra metade".
La Bruyère
No começo da história do ser, a vida é um prêmio.
No ato da fecundação, uns duzentos milhões de espermatozóides - células masculinas - penetram no corpo da mulher e, partindo na direção da trompa para alcançar o óvulo - célula feminina - apostam uma corrida de vida ou morte.
Excetuando-se os casos de gêmeos, apenas um, o mais forte, o mais ágil, vencendo barreiras e batendo o recorde de velocidade, alcança o óvulo e, penetrando-o, fecunda-o, nele se integrando para a formação de uma célula única: a pedra fundamental de um novo ser.
Ao vencedor, um prêmio, a Vida!
Os outros concorrentes morrem.
Conservar esta vida, então, é também um prêmio que será conferido ao mais forte, ao mais ágil, que há de viver esta vida que lhe foi dada até que ela se extinga naturalmente, seguindo o processo: nascer, crescer, amadurecer, envelhecer, morrer.
A marcha do tempo é inexorável. Ninguém pode pará-la, como ninguém pode fazer com que ela retroceda ou se acelere, e a ninguém é concedida a possibilidade de fugir de nenhuma de suas etapas.
A partir do instante da fecundação, quando se forma uma única célula, já começa a luta pela sobrevivência do ser, na imediata e rápida multiplicação das células que, sendo a princípio uma unidade, hão de atingir a soma de trilhões para formar o inpíduo adulto.
Esta luta, francamente manifesta em todas as atitudes de um recém-nascido, que suga avidamente o seio materno, que grita exigindo a satisfação imediata de suas necessidades vitais básicas, deve ser contínua e árdua pala vida afora, na defesa da integridade física e mental do homem, em busca de um lugar ao sol.
Luta para muitos penosa, feita de sacrifícios, de renúncias, de sofrimentos.
Luta contra vicissitudes, doenças, perigos sem conta que ameaçam a cada passo dado ao longo da estrada.
Perigos que crescem com a civilização. Se entre os povos primitivos temiam-se as feras, hoje, na era tecnológica, estas ficam presas no jardim zoológico, mas as máquinas, não menos mortíferas, estão soltas no mundo civilizado.
E assim poderíamos resumir: o homem moderno constrói aquilo que pode destruí-lo.
Mas, por outro lado, cientistas do mundo inteiro lutam pela preservação da vida humana.
A Medicina e a Higiene, neste século, vêm dando verdadeiros saltos na conquista de uma vida mais longa e mais sadia para a humanidade.
Cada vez mais se há de adiar o prazo que temos para andar sobre esse chamado "vale de lágrimas".
Pois bem, lutamos pela vida, e ela não vale nada? Conquistamos, a duras penas, mais alguns anos de vida, e para quê?
De que servem as pesquisas no campo da Medicina e Higiene, no mundo inteiro, no sentido de se prolongar a vida, se não sabemos o que fazer desses anos?
Ainda mais: por que este período da vida que nos é concedido precisa ser visto e sentido como inútil, como razão de lamúrias, de desespero e de infelicidade?
Se envelhecer é uma desgraça, não deveríamos cantar, nos aniversários de pessoas a quem queremos bem, a musiquinha:
"Parabéns pra você,
Nesta data querida.
Muitas felicidades!
Muito anos de vida".
Envelhecer é soma de vida. É somar aniversários.
É viver mais. É ouvir esta cantiga por muitos e muitos anos.
"Muitos anos de vida" quer dizer velhice.
Não é um paradoxo que se considere a velhice um mal, e se deseje este mal a quem queremos bem?
Então seria mais certo e lógico que terminássemos cantando:
"...Poucos anos de vida!"
Vejamos claramente: se viver é um bem, envelhecer quer dizer que ainda se tem esse bem - a VIDA.
Se a ciêncica em seus avanços, acresenta mais anos a vida, devemos nós acrescentar mais vida a esses anos - como ensina o Dr. Jacques Menétrier:
"É só por incompreensão que os tornamos vazios."
Tudo se aprende, menos a viver.
Vamos crescendo, olhando uns para os outros, aprendendo uns com os outros, dando assim continuidade aos mesmos erros.
Aprender a envelhecer equivale a aprender a viver.
Roberto Carlos canta: "Obrigado senhor por mais um dia!"
Vamos fazer como ele e agradecer por cada dia.
Que pelo menos no começo da segunda metade da vida, possamos acertar o passo!